Bate-papo Psicanalítico



Este espaço é dedicado àqueles que se interessam em aprender, discutir e trocar idéias sobre assuntos relacionados à mente e ao comportamento humano sob à luz da teoria psicanalítica.
Aproveitem e comentem!




A medicalização do sofrimento





É cada vez mais crescente a incidência de casos de depressão na atualidade. Dados da Organização Mundial de Saúde apontam a depressão como forma de sofrimento mental que cresce de forma epidêmica, sobretudo nos países industrializados. Estima-se que até 2020, se persistirem as tendências atuais da transição demográfica e epidemiológica, a carga da depressão subirá a 5,7% da carga total de doenças.

Para a psicanalista Maria Rita Kehl, hoje vivemos sob o imperativo da felicidade e do prazer. As pessoas que estão atravessando fases de desânimo ou tristeza absolutamente normais, por contingências da vida, sentem-se logo muito sozinhas, muito erradas, e são tratadas como depressivas. "E ficam deprimidas mesmo, em função disso!", afirma Kehl.

Diante desta realidade, o que se observa é uma busca desenfreada pelos medicamentos anti-depressivos que, na tentativa de fugir dos sinais da suposta depressão, acabam por mascarar o real problema do indivíduo, dificultando, inclusive, um diagnóstico mais preciso.

Diversos pesquisadores sinalizam, inclusive, a existência de uma crença equivocada de que os medicamentos podem resolver todos os problemas e sofrimentos psíquicos do indivíduo. A busca pelo alívio imediato dos sintomas, de preferência indolor, nos remete a características da nossa atual cultura e sociedade. O consumo exagerado, imediatista, a opressão pelas conquistas de idéias de beleza de tratamento.

Vale lembrar que os medicamentos têm a função de auxiliar o indivíduo na melhora de seu funcionamento físico, o que inclui o funcionamento cerebral. Porém, não tratamos somente de cérebros, e sim de pessoas que também reagem a um tratamento humano como o desempenhado pela psicoterapia e psicanálise. Ao abrirmos essa possibilidade do encontro humano, podemos oferecer uma nova escuta da dor mental e, conseqüentemente, um alívio das angústias na medida em que o homem passa a conhecer melhor os seus conflitos e sua própria história. 

Comentário postado com base em infomações coletadas no artigo "A psicanálise frente aos males sociais" do site Ciência e Cultura.




A Tragédia na escola de Realengo





Nesta semana, deparamo-nos com uma triste notícia que foi alvo da perplexidade e revolta de pessoas de todo o mundo: o massacre na escola de Realengo, no Rio de Janeiro, que dizimou 12 crianças e deixou outras tantas hospitalizadas.


O grande questionamento gira em torno do autor do crime, o jovem de 23 anos Wellington Menezes de Oliveira que suicidou-se após a trajédia e deixou poucas pistas sobre a motivação que o levou a cometer tal atrocidade.


São muitas as especulações e tentativas de explicar o comportamento do atirador, mas entre quase todas elas é unânime a crença de que tratava-se de um indivíduo com transtornos psicológicos e/ou mentais.

O psicanalista Alberto Goldin deu sua opinião sobre o perfil de Wellington: “Não é um psicopata. O psicopata tira vantagem, não se mata; o melancólico se mata. Psicopata não é suicida”. E completa: “Era um perturbado que queria terceirizar sua dor: muitos vão chorar por ele, através das mortes. Em outra circunstância, ninguém choraria por ele. Tem ainda o fascínio da mídia, que é grande – passa do anonimato a um inimigo público, imitando os americanos”.

O presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Antônio Geraldo da Silva, também opinou afirmando que Wellington provavelmente sofria de transtorno de personalidade e não de doença mental: “É um tipo de comportamento chamado em inglês de mass murder, ou seja, assassino em massa. Geralmente são indivíduos entre 20 e 30 anos, solitários, que não param em emprego, com poucos laços com família, amigos e vizinhança. Eles costumam ter traços paranoides. Por exemplo, achar que todos são sacanas com ele, olham estranho ou estão falando e tramando contra ele. Procuram o isolamento social e às vezes podem estar tristes ou mostrar sinais de depressão. Buscam vinganças contra perseguidores reais e imaginários”.

O psiquiatra acrescentou ainda que, diferentemente de uma doença mental (depressão, ansiedade, esquizofrenia, transtorno bipolar e outras fobias adquiridas e desencadeadas por algum fator), no transtorno de personalidade a pessoa já nasce com o problema, ou seja, não há tratamento.


Há também quem afirme que o isolamento o qual se submeteu o atirador de Realengo, foi um fator decisivo na consumação da tragédia. Segundo o professor Francisco Martins, do Instituto de Psicologia do Rio de Janeiro, esses casos em geral acontecem com quem está em profundo isolamento. “A pessoa não tem com quem compartilhar seus sentimentos, dividir suas angústias. Acaba perdendo a paciência consigo mesma. Quando isso acontece, ela estoura”, afirma. 


O professor Martins acrescenta ainda: "Nas grandes cidades, é mais fácil ficar só. Se aumenta a coesão social, o risco pode diminuir”. Segundo ele, a presença de uma pessoa próxima pode “desligar a fervura” numa situação como a do assassino da escola do Rio.


E você, o que pensa de tudo isto? Qual o diagnóstico que você daria para Wellington?


São muitas as versões dadas na tentativa de se traçar o perfil do criminoso, entretanto, o mais difícil é entender como todos que conviveram com Wellington, muitos deles, especialistas em seres humanos como educadores, médicos, gestores, assistentes sociais, entre outros, nunca perceberam (ou se omitiram - o que é mais provável) que havia algo de incongruente no comportamento deste assassino.


Diagnóstico do TDAH


O Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é um transtorno neuropsicológico com bases biológicas e caráter hereditário que afeta 10% da população mundial. É considerado hoje um grave problema de saúde que tem sido alvo de muitos estudos em todo o mundo. Deve ser cada vez mais discutido nas escolas, principalmente porque tal transtorno afeta a aprendizagem, as relações interpessoais e autoestima do aluno.

Recentemente, fiquei surpresa com a afirmação de um pai de aluno quando disse que seu filho recebeu o diagnóstico de TDAH pelo psiquiatra que o atendeu. Surpresa pelo diagnóstico, que é incompatível com as características e o comportamento do aluno, e surpresa principalmente por perceber que tal equívoco não partiu de uma pessoa leiga e sim de um profissional que deveria ter feito uma investigação criteriosa para fazer tal afirmação.

De certo, é muito comum ouvir pais e até professores rotulando indiscriminadamente uma criança como hiperativa. Este rótulo frequentemente usado no discurso popular é, muitas vezes, direcionado de forma arbitrária a qualquer criança travessa, inquieta e falante que “incomode” com seu comportamento agitado e desatento. O desconhecimento acerca do que é o TDAH leva a pensamentos equivocados e, consequentemente, a dificuldades no diagnóstico, no tratamento e nas intervenções necessárias a uma criança que realmente possui tal transtorno.

No caso do aluno que mencionei, o diagnóstico foi feito numa única consulta com o psiquiatra somente a partir de algumas informações dadas pela família e pelo garoto. Apesar de saber que o diagnóstico de TDAH é clínico - não existe até o momento, nenhum exame ou teste que possa sozinho dar este diagnóstico - este só pode ser construído corretamente a partir de diversas avaliações, muitas vezes com abordagem multidisciplinar. Neste caso, um relatório da escola sobre o comportamento, sociabilidade e aprendizagem da criança é de grande importância.

Depois de reunidas todas as informações, o médico deverá avaliar se os sintomas apresentados preenchem os critérios diagnósticos que são apresentados nos Manuais de Classificação (MCs) para o TDAH (os mais utilizados são o DSM-IV e o CID-10).

TABELA: Sintomas para diagnóstico de TDAH na criança

1. Não consegue prestar muita atenção a detalhes ou comete erros por descuido nos trabalhos da escola ou tarefas.

2. Tem dificuldade de manter a atenção em tarefas ou atividades de lazer.

3. Parece não estar ouvindo quando se fala diretamente com ele.

4. Não segue instruções até o fim e não termina deveres de escola, tarefas ou obrigações.

5. Tem dificuldade para organizar tarefas e atividades.

6. Evita, não gosta ou se envolve contra a vontade em tarefas que exigem esforço mental prolongado.

7. Perde coisas necessárias para atividades (por exemplo: brinquedos, deveres da escola, lápis ou livros).

8. Distrai-se com estímulos externos.

9. É esquecido em atividades do dia-a-dia.

10. Mexe com as mãos ou os pés ou se remexe na cadeira.

11. Sai do lugar na sala de aula ou em outras situações em que se espera que fique sentado.

12. Corre de um lado para outro ou sobe demais nas coisas em situações em que isto é inapropriado.

13. Tem dificuldade em brincar ou envolver-se em atividades de lazer de forma calma.

14. Não para ou frequentemente está a "mil por hora".

15. Fala em excesso.

16. Responde às perguntas de forma precipitada, antes de elas terem sido terminadas.

17. Tem dificuldade de esperar sua vez.

18. Interrompe os outros ou se intromete (p.ex. mete-se nas conversas / jogos).
(Adaptado do questionário SNAP-IV)



A partir dos sintomas explicitados acima, podemos fazer uma análise avaliando cada item com as seguintes indicações:


  • Nem um pouco 
  • Só um pouco 
  • Bastante 
  • Demais
Como avaliar:

1) se existem pelo menos 6 itens marcados como “BASTANTE” ou “DEMAIS” de 1 a 9 = existem mais sintomas de desatenção que o esperado numa criança ou adolescente.

2) se existem pelo menos 6 itens marcados como “BASTANTE” ou “DEMAIS” de 10 a 18 = existem mais sintomas de hiperatividade e impulsividade que o esperado numa criança ou adolescente.

O questionário SNAP-IV é útil para avaliar apenas o primeiro dos critérios (critério A). Para se fazer o diagnóstico, deve se levar em consideração outros critérios que também são necessários. São eles:

CRITÉRIO A: Sintomas (vistos acima)

CRITÉRIO B: Alguns desses sintomas devem estar presentes antes dos 7 anos de idade.

CRITÉRIO C: Existem problemas causados pelos sintomas acima em pelo menos 2 contextos diferentes (por ex., na escola, no trabalho, na vida social e em casa).

CRITÉRIO D: Há problemas evidentes na vida escolar, social ou familiar por conta dos sintomas.

CRITÉRIO E: Se existe outro problema (tal como depressão, deficiência mental, psicose, etc.), os sintomas não podem ser atribuídos exclusivamente a ele.


Há ainda que se considerar que existem 04 tipos de TDAH com ou sem comorbidades.

a) TDAH do tipo predominante desatento.

b) TDAH do tipo Hiperativo/Impulsivo.

c) TDAH do tipo combinado.

d) Tipo inespecífico.

Lembre-se que o diagnóstico definitivo só pode ser dado por um profissional. Portanto, caso haja suspeita de TDAH, o mais seguro ainda é encaminhar para a avaliação de um médico, de preferência, psiquiatra.


Nohara Alcântara